Mário Magalhães
03/10/2013 11:47
Ontem e hoje, o pau-de-arara. E amanhã? – Foto reprodução
Não passa de equívoco histórico afirmar que a ditadura inaugurada em 1964 introduziu a tortura no país.
Tal expediente consagrou-se durante a escravidão, quando a lei contemplava o castigo físico dos negros cativos. O pau-de-arara, instrumento de sevícias empregado contra os escravos, perenizou-se. Os agentes públicos recorreram a ele ao torturar presos políticos no período 1964-85.
O que fez a ditadura instaurada com a deposição do presidente constitucional João Goulart foi adotar a tortura como política de Estado, ainda que nenhuma norma legal autorizasse a conduta.
Ao contrário do que sucedeu com funcionários do III Reich depois da guerra e com repressores argentinos da ditadura 1976-83, os torturadores e assassinos a soldo do Estado não foram punidos no Brasil.
A tortura e o desaparecimento forçado são crimes imprescritíveis, mas os violadores de direitos humanos estão morrendo de velhos, sem ter sentado no banco dos réus ou dormido uma só noite na cadeia.
Vigora a impunidade.
Se escapou de processo, julgamento e condenação quem torturou milhares de cidadãos, matou mais de 400 (a maioria executada sumariamente, na tortura ou depois dela) e sumiu com uma centena e meia, por que os servidores públicos do futuro não escapariam?
A impunidade contribui para eternizar a prática da tortura por agentes do Estado. O pau-de-arara que vem da escravidão e da ditadura sobrevive como hardware em instalações policiais do país, como o noticiário comprova. Barbarizam jovens e pobres, na maioria negros e mestiços.
A Polícia Civil do Rio de Janeiro concluiu que o pedreiro Amarildo foi assassinado por PMs que o teriam torturado na noite de 14 de julho de 2013. O Brasil está repleto de casos como o de Amarildo, de São Paulo ao Pará, do Paraná a Alagoas.
A discussão sobre a punição aos torturadores e homicidas da ditadura aborda o passado somente na forma. O conteúdo essencial trata do Brasil que se quer construir, com ou sem tortura, com ou sem impunidade.
Punir os antigos repressores é tão importante quanto condenar os matadores do Amarildo. As agendas se combinam, como uma receita única para combater o mal.
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