Evento: Prêmio Frei Tito de Alencar de Direitos Humanos
Local: Complexo das Comissões da Assembleia Legislativa do Ceará
Dia/Hora: 10 de dezembro de 2013, às 15h.
Contato: 3277.2560
ALCE - Gab. Dep. Eliane Novais
Papéis revelam ação anterior à Operação Condor |
Autor(es): Roberto Simon |
O Estado de S. Paulo - 09/10/2013 |
A Comissão da Verdade localizou no Arquivo Nacional de Brasília documentos secretos que ligam o desaparecimento, no fim de 1973, de três militantes de esquerda no Rio de Janeiro e dois em Buenos Aires, revela Roberto Simon. A descoberta reforça a tese de que os serviços de inteligência do Cone Sul cooperavam na luta contra a “subversão” antes mesmo da criação da Operação Condor
Documentos ligam desaparecimentos no Brasil e na Argentina antes da cooperação entre os países
A Comissão Nacional da Verdade localizou documentos secretos que ligam diretamente os desaparecimentos de três militantes de esquerda no Elo de Janeiro e dois em Buenos Aires, ambos ocorridos no fim de 1973. As informações reforçam a tese de que serviços de inteligência do Cone Sul já cooperavam na luta contra a "subversão" antes mesmo da Operação Condor, que teria início dois anos mais tarde.
Encontrados no Arquivo Nacional de Brasília, os papéis trazem novos detalhes sobre o sumiço do francês Jean Henri Raya Ribard, do argentino Antonio Pregoni e do brasileiro Caiupy Alves de Castro em Copacabana, em 23 de novembro de 1973. Os sequestros teriam ligação com a prisão, na capital argentina, do major exonerado e banido do Brasil Joaquim Pires Cerveira e do também brasileiro João Batista Rita, em dezembro daquele ano.
Os documentos foram localizados pelo grupo de trabalho da comissão que investiga a Operação Condor, sob a coordenação da advogada Rosa Cardoso. Na sexta-feira, a Comissão Nacional e a Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva, de São Paulo, farão uma audiência pública sobre os três desaparecidos no Rio em novembro de 1973. Falarão no evento o secretário executivo do Arquivo Nacional da Memória da Argentina, Carlos Lafforge, e a psicanalista Mabel Bernis Raya, viúva do francês Raya. Ela vive atualmente em Buenos Aires, onde foi localizadapela comissão nacional.
"Tenho enorme satisfação em dar uma voz aos desaparecidos, essa categoria de vítimas de nossas ditaduras que não estão nem mortas, nem vivas. É preciso mostrar que pessoas não "desaparecem" - e meu marido daquela época não desapareceu77, disse Mabel, em entrevista por telefone ao Estado.
Mo início de 1974, ela viajou ao Rio em busca de Raya e, depois de levantar as primeiras informações, foi "aconselhada" por seu advogado a deixar imediatamente o Brasil. "Tentei também recorrer ao consulado francês, mas sem resultados. Agora sinto que essalongahistó-ria terá um desfecho."
Ciex. A principal tese sobre os desaparecimentos é que Raya, vigiado pela inteligência brasileira, manteve contato com exilados na Argentina e, em seguida, com pessoas que viviam na clandestinidade no Rio. Um relatório interno do Centro de Informações do Exterior (Ciex), do Ministério das Relações Exteriores, localizado pela comissão, corrobora essa hipótese.
No documento, datado de março de 1974, o agente Alberto Conrado Avegno - codino-me "Altair" - relata segredos obtidos por um informante não identificado. Segundo a fonte, a poeta argentina Alicia Eguren, militante peronista, era a ponte entre o maj or brasileiro Cerveira, exilado na Argentina após ter sido banido do Brasil, e o grupo integrado pelo francês Raya e pelo argentino Pregoni. Este último também preso em Copacabana - era veterano do movimento armado dos tupamaros, do Uruguai.
Ainda com base no relato do informante, o documento do Ciex avisa que o francês viajara ao Brasil em novembro de 1973 para uma ação armada em parceria com o grupo do major do Exército. O alvo da suposta operação não é identificado. A fonte da inteligência brasileira iria ao Rio para investigar melhor o que havia acontecido com Raya - identificado erroneamente no relatório pelo nome de "Juan Rays".
Para o secretário executivo da Comissão Nacional da Verdade, André Saboia Martins, não há mais dúvidas de que os sequestros no Rio e em Buenos Aires, no fim de 1973, são parte de uma mesma história. "Além do relatório do Ciex, que cita explicitamente o nome dos envolvidos, há outras referências aos casos nos documentos encontrados pela comissão", afirma Sabóia.
Os três presos na zona sul do Rio haviam passado por Buenos Aires pouco antes. À época, a Argentina estava sob a presidência de Juan Domingo Perón, eleito após voltar do exílio, em 1973 " os militares tomariam "oficialmente" a Casa Rosada cm 1976. Mesmo assim, setores dos serviços de segurança de ambos os lados da fronteira criaram canais de cooperação, mostram os documentos.
A partir de 1975, esse esforço conjunto seria institucionalizado em uma reunião no Chile sob o emblema da Operação Condor.
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São Paulo – O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou haver possibilidade jurídica de punir agentes do Estado que cometeram crimes durante a ditadura (1964-85). Em parecer encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Janot muda o entendimento do antecessor, Roberto Gurgel, para quem a questão estava enterrada desde que em 2010 a Corte se manifestou pela plena constitucionalidade da Lei de Anistia, aprovada pelo Congresso em 1979, ainda durante o regime.“A imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade constitui norma jurídica imperativa, tanto de caráter consuetudinário quanto de caráter principiológico, do direito internacional dos direitos humanos”, defende Janot, que tomou posse no último dia 17 em Brasília e já marca uma diferença grande em relação ao antecessor. Em 2010, Gurgel encampou a visão do STF de que a anistia "resultou de um longo debate nacional para viabilizar a transição entre o regime militar e o regime democrático atual". O Ministério Público Federal vem movendo nos últimos anos ações visando à punição penal dos torturadores, mas até agora o ocupante do cargo mais alto da instituição não havia se manifestado de forma tão categórica a favor da existência de um caminho jurídico para garantir condenações.Janot externou sua posição em parecer sobre a extradição de um policial argentino que atuou durante o último regime autoritário daquele país (1976-83). O documento, datado de 24 de setembro, foi divulgado hoje pelo MPF, e acolhe a perspectiva de que o Direito Internacional Público resguarda os direitos básicos da população. Esta é, também, a primeira vez que o procurador-geral se posiciona em favor do acolhimento da sentença proferida em dezembro de 2010 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Na ocasião, a entidade integrante da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil por não investigar os fatos do passado e não punir agentes do Estado, e determinou que a Lei de Anistia não fosse utilizada como pretexto para deixar de apurar e sancionar violações.“Na persecução de crimes contra a humanidade, em especial no contexto da passagem de um regime autoritário para a democracia constitucional, carece de sentido invocar o fundamento jurídico geral da prescrição”, avalia Janot. “Nos regimes autoritários, os que querem o socorro do direito contra os crimes praticados pelos agentes respectivos não deixam de obtê-lo porque estão dormindo, e sim porque estão de olhos fechados, muitas vezes vendados; não deixam de obtê-lo porque estão em repouso, e sim porque estão paralisados, muitas vezes manietados.”Na avaliação da Corte Interamericana, em uma leitura reiterada por várias convenções firmadas no âmbito das Nações Unidas, não há que se falar em prescrição de crimes que violam os direitos humanos básicos. A visão parte do “ius cogens”, termo em latim que designa o direito de gentes, figura jurídica acolhida pela Constituição argentina desde o século 19. Janot adverte que, ainda que a legislação brasileira tenha diferenças em relação à do país vizinho, os direitos básicos garantidos pela Carta Magna garantem a imprescritibilidade deste tipo de infração e, na falta dela, o Direito internacional.O entendimento de Janot contraria não apenas o de Gurgel, mas o de alguns ministros do STF, que após a condenação pela Corte Interamericana se manifestaram no sentido de que as decisões tomadas internamente se sobrepunham às adotadas internacionalmente, o que contraria convenções adotadas pelo Brasil, entre elas a Convenção de Viena, conhecida como “tratado dos tratados”, editada em 1969 e promulgada no país 40 anos depois.Agora, o procurador-geral acolhe a visão mais comum no plano externo, de que o Direito Internacional se baseia em regras comuns, do ponto de vista moral, à maioria das nações – como, por exemplo, a visão de que a tortura deva ser repudiada e punida, independentemente de quando tenha ocorrido – e que, na falta de ação dos Estados nacionais, a comunidade global tem o dever e o direito de garantir punições a agentes que incorram neste tipo de violação. Para Janot, é “hipocrisia hermenêutica” a posição de que os crimes cometidos pela ditadura devam ser deixados no passado. “Não há segurança jurídica a preservar quando a iniciativa se volta contra o que constituiu pilar de sustentação justamente de um dos aspectos autoritários de regime que, para se instaurar, pôs por terra, antes de tudo, a mesma segurança jurídica.”Desde a decisão da Corte Interamericana, o MPF testou algumas vezes o Judiciário federal em ações contra algumas figuras do regime – entre elas, Carlos Alberto Brilhante Ustra, comandante do DOI-Codi em São Paulo entre 1970 e 1974. Alguns casos foram arquivados, mas outros têm seguido adiante. Na última semana a Justiça Federal em São Paulo recusou o arquivamento de um dos processos e determinou a tomada de depoimentos de testemunhas relacionadas ao caso do corretor de valores e ex-fuzileiro naval Edgar de Aquino Duarte, preso em junho de 1971 e visto pela última vez em 1973.Até agora, porém, nenhuma dessas ações chegou ao STF, que tampouco julgou os recursos apresentados pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) à decisão tomada em 2010, ao rejeitar a possibilidade de punir torturadores até então resguardados pela Lei de Anistia. Não se sabe se a nova composição da Corte, que de lá para cá assistiu à substituição de alguns ministros, poderá levar a uma nova interpretação, que alinhe o Direito interno brasileiro à visão defendida pela OEA.Curiosamente, ao julgar outros pedidos de extradição da Argentina, alguns dos magistrados que rejeitaram a possibilidade de condenação penal no Brasil aceitaram a leitura de que crimes contra a humanidade são imprescritíveis. Relator do caso do agente Cláudio Vallejos, Gilmar Mendes defendeu no ano passado que “nos delitos de sequestro, quando os corpos não forem encontrados, em que pese o fato de o crime ter sido cometido há décadas, na verdade está-se diante de um delito de caráter permanente, com relação ao qual não há como assentar-se a prescrição”.É esse um dos argumentos que têm sido testados pelo MPF, e que agora é defendido também por Janot. Ele pediu que o STF autorize a extradição do argentino Manuel Alfredo Montenegro, acusado de crimes de privação ilegítima de liberdade e tortura durante a ditadura no país vizinho. Segundo a Interpol, o então inspetor da Polícia Federal prendeu e torturou três militantes – ele tem prisão decretada pela Justiça da província de Misiones desde 2010.