O coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Claudio Fonteles, defende que a sociedade participe de todo o processo de discussão e elaboração das recomendações da CNV. “A sociedade deve ser consultada sobre temas que possam constar das recomendações”, afirmou. O tema foi um dos debatidos na reunião de planejamento da CNV para 2013, realizada no início desta semana em Brasília.
A Comissão Nacional da Verdade foi instalada em maio de 2012 para produzir em dois anos um relatório circunstanciado das graves violações de direitos humanos que ocorreram entre 1946 e 1988, período que inclui o regime ditatorial de 1964 a 1985. Com o relatório, a CNV deve apresentar recomendações concretas ao Estado brasileiro para evitar que se repita no país uma nova experiência de supressão de direitos.
Fonteles, que está no último mês de seu mandato como coordenador da CNV*, voltou a falar da questão da formação militar, que já havia abordado em entrevistas e quando a Comissão esteve em Belém, em agosto.
Em debate realizado no Instituto Brasileiro de Museus, no dia 16, Fonteles afirmou que: “as recomendações devem ser sobre coisas bastante práticas: qual o papel constitucional reservado ao militar na construção de uma sociedade democrática?”, questionou.
Em Belém, no final de agosto, durante um encontro na Ordem dos Advogados do Brasil, a Comissão de Direitos Humanos local denunciou trotes violentos ocorridos numa unidade da Aeronáutica. A CNV levou o caso ao conhecimento do Ministério da Defesa e ao Procurador-Geral da Justiça Militar, Marcelo Weitzel.
RECOMENDAÇÕES EM ANDAMENTO - Em entrevista ao Ibram, Fonteles voltou a defender a preservação de locais pelo país onde ocorreram graves violações de direitos humanos e a sua transformação em espaços de memória.
“Foi uma política traçada pela Comissão, que certamente vai se consolidar também nas recomendações: transformar todos esses locais, no país inteiro, que se notabilizaram por representar a repressão do estado ditatorial militar, esses espaços de tortura e assassinatos, em museus, espaços vivos, de construção da história, de conhecimento, para que nunca mais se repita essa experiência ditatorial, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça”, disse.
A CNV já oficiou recomendando a autoridades federais, municipais e estaduais a preservação de prédios onde funcionaram unidades do Doi-Codi, do Dops e outros locais onde ocorreram graves violações de direitos humanos para a sua posterior transformação em espaços de memória.
Fonteles defende a popularização dos museus e dos arquivos públicos e que a visitação dos cidadãos a estes espaços se torne uma atividade tão cotidiana “quanto ir à padaria”. O coordenador da CNV afirma que desde maio semanalmente vai ao Arquivo Nacional para pesquisa documental e que esse trabalho mudou sua visão sobre arquivos. “Para mim, arquivo era uma coisa morta, imprestável, papel inútil. E hoje eu não saio de lá”.
TEXTOS E TRAUMA - Foi com base em documentos localizados no Arquivo Nacional que Fonteles produziu 11 textos sobre sete casos de mortos e desaparecidos e quatro outros contextualizando questões relativas à estruturação do Estado ditatorial-militar, que estão disponíveis para consulta popular e sugestões no site da CNV. A ideia dos textos é demonstrar, com documentos produzidos pelo próprio regime, as mazelas da ditadura.
A Comissão Nacional da Verdade esteve reunida nos dias 28 e 29 de janeiro para definir o planejamento de ações para o ano de 2013. A meta estabelecida pela Comissão é concluir sua pesquisa até o final deste ano e usar 2013 para dar a redação final ao relatório e as recomendações.
* Conforme prevê o regimento interno da Comissão Nacional da Verdade, a coordenação deve ser exercida em revezamento pelos membros, divididos em sete ciclos, o primeiro de cinco meses e os seis seguintes de três meses cada. Fonteles foi coordenador interino de setembro a novembro, substituindo Gilson Dipp em licença médica. Fonteles é o titular do posto desde 16 de novembro, encerrando seu ciclo no próximo dia 15 de fevereiro.
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